PLARD (HPAS) – ANGELUS SILESIUS, HOMEM NO CENTRO DO MUNDO
HPAS
O pensamento de Angelus Silesius prolonga no século XVII o dos místicos medievais, ele próprio em constante relação com a escolástica; em nenhum lugar este lugar que ele ocupa como herdeiro de uma tradição aparece mais claramente do que em sua concepção do mundo. Assim como Jakob Boehme, ele vê nele forças antitéticas, a luta da luz e das trevas; assim como ele, também, ele coloca em seu centro a vontade humana, possibilidade de escolha entre o retorno a Deus e o inferno interior, feita de tempo e eternidade e podendo se “revestir” de um ou outro princípio “Mas porque o homem tem uma inclinação para estas duas forças, ele pode escolher a que quiser; pois ele vive neste mundo entre as duas, e as duas qualidades, bem e mal, estão nele; aquela à qual o homem se entrega, ele é revestido dela, seja de força santa ou infernal” (prefácio de Aurora).. Mas sua semelhança se limita a este esquema geral. Boehme está instalado no coração de seu século: seu mundo foi abalado pela recente filosofia da natureza, as ideias de Paracelso, especulações sobre o macrocosmo e o microcosmo; ele integra à imagem que dele dá tanto os primeiros ensaios hesitantes da química quanto as descobertas astronômicas. Sobretudo, reconhece-se em sua obra, sem dificuldade, o mundo do século XVII estilizado: mesmo quando não descreve sua evolução no tempo, como faz no prefácio da *Aurora*, ele mostra nele, sob o nome de luz e trevas, Deus e o Demônio, o Bem e o Mal; uma angústia moral está na base de sua especulação; ele busca antes de tudo explicar os contrastes do pecado e da graça que ele vê a cada dia em confronto, como o Sim e o Não em que “consistem” todas as coisas. É impossível concebê-lo fora de sua época. Para Silesius, os problemas que o mundo apresenta são menos morais que ontológicos: Deus é menos o Bem do que o Ser, a Essência da qual ele deduz a procissão como fazia a escolástica. O pecado, que para Boehme era uma realidade central, é definido por Silesius como um não-ser, comparado à sede que tortura sem ter realidade (I, 213); “o mal não tem essência” (II, 166), diz ele; e, de fato, tudo se traduzirá nele em termos de metafísica essencial: “as trevas” e “a luz” representam “o acidente e a essência” (*Zufall und Wesen*), dos quais um passa, enquanto o outro permanece eternamente em Deus. Notamos de passagem algumas alusões a doutrinas de seu tempo; mas a linha geral de seu pensamento é resolutamente inatual; nem a guerra, nem o novo saber, nem mesmo as lutas confessionais alteraram sua imagem do mundo, que é sensivelmente a de Eckhart; e as dificuldades interiores de seu pensamento residem muito mais na passagem de um plano do Ser para outro do que nas dúvidas suscitadas na alma humana pelo espetáculo de um mundo feito de bem e mal, obra, no entanto, de um Deus de amor. A criação o interessa como elemento de um conjunto que compreende também Deus e a alma humana; mas nessas duas realidades centrais se esgota o que ela pode conter de realidade; ela não existe no sentido pleno do termo senão na Medida em que, procedendo de Deus, ela retorna a Deus pelo homem. Em nenhum lugar se encontraria em seu pensamento o rastro de um interesse profundo pelo mundo concreto ou pelo Cosmos. E suas soluções estão em conformidade com a boa tradição medieval da mística eckhartiana.
