ATFO
Quando concebi esse projeto (o de escrever uma história da Terra e de seus habitantes), eu ainda era jovem e cheio daquela esperança que uma juventude demasiado presunçosa concede. Não via nenhum dos obstáculos que deveriam me deter na imensa carreira que me julgava capaz de percorrer. Orgulhoso de certa força moral e determinado a um trabalho obstinado, acreditava que nada resistiria ao duplo ascendente da perseverança e do amor à verdade. Mergulhei, pois, no estudo com uma ardor insaciável, acumulando incessantemente conhecimentos, sem me preocupar muito com o uso que um dia faria deles. Devo dizer que minha posição política me forçava um pouco ao recolhimento que tal devoção exigia. Embora não tivesse me destacado durante a Revolução, mantendo-me à mesma distância de todos os partidos, alheio a qualquer intriga ou ambição, conhecera suficientemente as coisas e os homens para que minhas opiniões e meu caráter não permanecessem totalmente obscuros. Circunstâncias alheias à minha vontade as haviam revelado a Bonaparte, exagerando ainda mais aos seus olhos o que nelas havia de contrário a seus desígnios; de modo que, desde sua entrada no Consulado, nutria por mim um ódio suficientemente forte para me proscritar sem motivos, incluindo meu nome entre os duzentos infelizes que enviou para perecer nas costas inóspitas da África. Se, por um sinal de benevolência da Providência, escapei a essa proscrição, precisei agir com extrema prudência enquanto durou o reinado de Napoleão, para evitar as armadilhas que ele poderia ter armado contra mim.
Meu gosto e minha situação coincidiam, assim, em me fazer amar o retiro e me entregar de corpo e alma ao estudo.