===== KOLAKOWSKI (LKCE) – ANGELUS SILESIUS, SACRIFÍCIO DO AMOR MÍSTICO ===== LKCE O fenômeno do amor é uma espécie de fome e, como toda fome, tende a se satisfazer, realizando-se na extinção. Ele se diferencia de outros tipos de fome por seu caráter total e, principalmente, por existir apenas por um movimento de exteriorização, comportando, invariavelmente, uma "necessidade de sacrifício". Por isso, o objeto do desejo só pode ser assimilado como resultado da "eliminação" prévia, pelo sujeito, de sua própria [[evangelho-de-jesus:logia-jesus:logia-jesus:riqueza:start|Riqueza]]. Esse desejo de renúncia está presente em toda forma intensa de amor, precisamente por seu caráter total, abrangendo todas as riquezas pessoais que o sujeito amante considera suas. Além disso, o caráter total do amor é independente do caráter particular do objeto para o qual ele é direcionado. Esta é uma observação banal, feita inúmeras vezes, e que se aplica tanto ao amor especificamente religioso quanto ao amor físico ou a todas as formas de apego afetivo a coletividades humanas (nação, pátria, família, etc.). O que nos interessa é notar uma certa equivocidade contida no próprio fenômeno, particularmente visível quando entra em jogo o amor pelo Ser absoluto — seja o [[biblia:figuras:divindade:deus:start|Deus]] pessoal ou a natureza espinoziana. No ato de amor, expressa-se a separação vivida como sofrimento. A natureza integral do amor faz com que a separação também seja sentida como um fenômeno integral, ou seja, a separação se identifica com a própria existência individual. Por isso, se o amor contém esse desejo impaciente de se unir completamente ao seu sujeito, ele também contém a nostalgia do aniquilamento, que se renova constantemente em todo lirismo místico e é seu tema principal. Assim, o amor, naturalmente, quer que se viva a própria existência separada como fonte de sofrimento e, portanto, como um mal experimentado. Ao se realizar pela negação da personalidade, o amor místico é de certa forma forçado a ter uma visão dualista do mundo. Nela, toda diferenciação e multiplicidade, em geral tudo o que leva a marca da separação, é corrompido pelo sofrimento e pelo mal, ou é visto como uma pseudorealidade, um mundo ilusório, enquanto a unidade total realiza em si todo o bem possível. Esse sentimento do "não-natural da natureza", a diferenciação vivida como alienação e enfermidade, encontramos não apenas nos místicos cristãos, mas também em panteístas-naturalistas como Giordano Bruno ou Spinoza. A realização do amor, que significa a mesma coisa que a extinção benevolente do Ser separado, compreendido como fonte do mal, impõe, portanto, uma óptica maniqueísta, onde o *principium individuationis* (a matéria, mas não necessariamente só a matéria) representa o lugar da queda, e é simplesmente negado no desejo de amor. {{indexmenu>.#1|skipns=/^playground|^wiki/ nsonly}}